segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Empresas espelham homens



     Durante o processo de criação o homem vive um momento de inspiração, no qual ocorrem as idéias a serem aplicadas no seu desafio. Aqui, a palavra inspiração tem o mesmo sentido que o movimento da inspiração do ciclo da nossa respiração. É o momento em que trazemos para dentro de nós o elemento exterior que será metabolizado por nossa interioridade, para em seguida ser expirado por nossas narinas ou por nossas ações.


     Porém, que metabolismo é esse por que passam as idéias? É o processo de identificação conosco, ou seja, é a humanização da criação. Desta forma, podemos afirmar que tudo que o homem cria ou faz é a reprodução de si próprio.


     Podemos então, sem sustos, afirmar que o mundo exterior é plenamente espelhado ou refletido num mundo interior igualmente infinito. Esse mundo interior é o espaço a ser trabalhado através da educação, para que cresça e acomode uma compreensão mais ampla e complexa da realidade exterior.


     Se nos é difícil compreender isso hoje, temos um consolo e um forte estímulo também para reverter nossa limitação. Na antiga Grécia, em 400 a.C., Sócrates reafirmava: “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”.


     Quando criamos uma empresa ou qualquer outra instituição o fazemos a partir do modelo do desenvolvimento humano vivido, com primeira infância, segunda, adolescência e fase adulta.


     Na primeira infância, fase que vivemos dos 0 aos 7 anos, a prioridade é plasmar um corpo físico próprio, emancipado das células doadas pelo ventre materno. A criança dessa idade possui saúde instável e variações bruscas de febres que revelam pouco domínio sobre seu metabolismo. Do mesmo modo, as empresas nascentes priorizam a construção de seu corpo físico, dotado, frequentemente, de um espaço físico com móveis, utensílios e equipamentos imprescindíveis ao seu desenvolvimento. A saúde deste empreendimento é instável e, semelhantemente à criança, suas células podem ser fruto de empréstimos também.


     A fase seguinte, entre os 7 e 14 anos, é da criação de hábitos e ritmos na criança e pela busca de ídolos. Todos os hábitos, bons e ruins, cultivados nessa fase são, via de regra, solidificados pelo resto da vida. Nas empresas esse mesmo fenômeno se dá pela necessidade de criação de processos internos, de organizar suas rotinas, estabelecer alçadas e limites de competências, organogramas e evidenciar sua missão e visão, a serem idolatrados. Agora, a empresa necessita mais organizar seus processos que seus bens físicos.


     A adolescência, compreendida entre os 14 e os 21 anos, é conhecida por impulsionar os jovens em direção à construção do social. É o período em que há necessidade de buscar a identidade grupal, a delimitação de seu espaço coletivo e a afirmação da individualidade através de riscos a que se expõe. Uma fase, como sabemos, de conflitos freqüentes. 

     Paralelamente, nas empresas, uma vez superada a obrigação de ser organizar e estabelecer seus processos internos, a necessidade passa a ser a criação do social em seu setor de atividade. Neste ponto, as organizações passam a serem vistas como modelos potenciais em seu campo de atividade e, assim, seus gestores sentem-se convocados a participarem mais ativamente do movimento classista, seja por representação sindical, seja opinando na elaboração de políticas públicas atinentes ao seu negócio. A empresa atinge nesse momento uma grande visibilidade, que lhe confere alta exposição e consequentes riscos à sua imagem decorrentes de disputas por espaço político.


     Finalmente, a fase adulta se caracteriza pela formação da identidade. Nessa idade, os seres humanos fortalecem a própria imagem e expõe seu caráter como atributo construído ao longo da vida fazendo dele, por vezes, seu principal valor ao buscar reproduzir nos seus descendentes essa marca  individual. Nas empresas, chegada essa fase, ocorre um processo de institucionalização de sua imagem. É um período de engessamento de seus métodos e valores. Cria-se uma imagem tão sólida e impregnada de valores que oferece grande segurança aos seus funcionários, parceiros, fornecedores e clientes, mas que pode virar uma ameaça à sua própria sobrevivência na medida em que perde o dinamismo exigido pelo mercado.


     Essa comparação meramente ilustrativa é para mostrar a partir da imagem biográfica do ser humano organizada pela Antroposofia que as nossas criações são inspiradas em nós mesmos. Nas pessoas o ciclo biológico é muito próximo entre os indivíduos, permitindo homogeneizar a regra cronológica. Diferentemente, nas organizações a sequência é bastante comum a todas, porém, os tempos podem variar bastante entre elas. Isso já se dizia há mais de 25 séculos, na famosa Grécia quando Protágoras afirmava pelas esquinas que: “O homem é a medida de todas as coisas”.       



Publicado no jornal Cinform 25/10/2010 – Caderno Emprego

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