segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Só faço previsão após os noventa minutos



     Uma das grandes inquietações humanas é prever o futuro. Àqueles que se dizem leitores do futuro, atribuímos adjetivos caros aos mortais, como por exemplo, mago, sobrenatural, paranormal, etc. Fazer previsões sobre o amanhã não é mesmo tarefa fácil. Daí o título deste texto que nos remete a uma resposta “previsível” de jogador de futebol abordado pela imprensa antes do jogo.

     De fato, erramos demais as previsões. Pesquisas demonstram que, em média, apenas 20% das previsões são certeiras e não estão associadas à área de domínio do pretenso visionário. Assim, economistas não acertam eventos futuros na economia com maior chance que pessoas leigas. Há um debate célebre com o falecido economista Mário Henrique Simonsen, ex-ministro do regime militar brasileiro, quando questionado sobre as previsões erradas na economia, disse: “a economia não comporta previsões”. E indagou, desafiador: “Alguém aqui pode lembrar alguma previsão de um economista que tenha dado certo?” Na hora, um debatedor citou o caso do economista marxista húngaro Jenö Varga, que previu a crise da Bolsa de New York em 1929. A reação de Simonsen surpreendeu a todos: “Varga era tão ruim que acertou”.

     Uma das causas de errarmos tanto nas previsões, é que partimos de uma compreensão equivocada do presente para especular sobre o futuro. Disso resulta que 25% dos americanos se consideram parte do 1% que possui capacidade de liderança ou, ainda, 90% deles, se avaliam motorista acima da média. Distorções, essas, capazes de ruborizar um bom discípulo socrático, seguidor do “sei que nada sei”. 

     Com efeito, nosso fracasso maior sobre previsões advém de uma limitação instrumental do nosso cérebro que está totalmente a serviço do nosso passado, por meio da memória e da aprendizagem já executada, fontes do nosso pensar. Por certo, pensar o futuro com a mesma facilidade que o passado, é o sonho de todo investidor, toda seguradora ou apostador de loterias. Mas, como isso nos é impossível, só resta uma maravilhosa solução: não adivinhar passivamente qual será o porvir e sim, faze-lo acontecer por meio de nossas ações, como fazem os empreendedores. Dessa forma, concluímos que o futuro se constrói a partir de nossa vontade e das nossas ações.

     Podemos afirmar que o astrônomo e matemático francês Laplace (séc. XIX) trouxe para a humanidade a ilusão da previsibilidade plena, quando demonstrou o funcionamento do universo segundo leis matemáticas. Assim, se todo o cosmo funciona como um relógio, influenciando a natureza terrestre, então, o futuro seria conhecido através dessas mesmas leis, ou seja, uma mera questão de computação, que denominou “intelecto”. E reforça: “para um intelecto como esse, nada seria incerto e o futuro, assim como o passado, estaria presente diante dos seus olhos”.

     Saber a data que os planetas voltarão a se alinhar ou o horário exato das marés é fruto da leitura de um sistema simples que pode ser equacionado com um M.M.C. – mínimo múltiplo comum, do ensino fundamental. O mesmo não se aplica a sistemas complexos como a economia de uma nação que depende de fatores externos, absolutamente fora do controle de qualquer dos seus agentes. Aliás, por sistema, devemos entender que nele, nenhum elemento pode possuir controle sobre o todo.

     O saudoso Millôr Fernandes, com suas frases geniais ensinou que “o passado é o futuro usado”. E quem usa o futuro? Certamente, os empreendedores, agentes de transformações sociais, culturais e econômicas, movidos pelo inconformismo típico dos que interveem nas estruturas vigentes pela via da inovação e, muitas vezes, acelerados pelos momentos de crise, a abrir os caminhos por onde a humanidade passará.

     Portanto, com a chegada do fim do ano, é hora de fazer previsões que engordam o ibope dos programas de TV. E, se não encontramos os profetas facilmente esses dias, é porque estão calibrando suas bolas de cristal, para dar conta do volume de serviços que vem por ai.



  Publicado no Jornal Cinform em 02/12/2013 - Caderno Emprego

2 comentários:

  1. E de previsão em previsão, ano a ano, a gente vai criando esperanças. Mal não faz. E como foi delicioso ler o seu texto fluente.

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    1. Cara Professora, muito obrigado por sua leitura e valioso comentário. Grande abraço.

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